terça-feira, 24 de julho de 2012

História do cerco a Lisboa.

Entrar na última casa onde habitou Fernando Pessoa, para mim, foi algo mágico e paradoxalmente trágico.
A Casa Fernando Pessoa é um espaço arquitectónico excelente, totalmente decorado- desde a fachada- com frases míticas do poeta. Uma biblioteca enorme com montes de livros de e sobre Pessoa. Pormenor excelente o facto de ter imensos desenhos de alunos de escolas primárias por todo o lado. Só me chateia é o facto de serem todas escolas privadas. No ensino público, Pessoa é introduzido demasiado tarde na minha modesta opinião.
Há imensos objectos pessoais de Pessoa por todo o lado, mas entrar no quarto onde o escritor viveu vários anos e escreveu algumas das suas obras primas é muito estranho... É como se Pessoa subitamente se transformasse numa pessoa. Como se um deus tivesse saído do seu templo e adquirisse a forma humana e os inerentes defeitos que os humanos carregam em si.
Pessoa para mim não era humano. É genial demais para sê-lo... e ver a sua roupa, a sua cama, o seu guarda-fatos, a secretária, o espaço no qual escreveu textos intemporais, tornou-o quase um comum mortal.
Tenho por princípio nunca querer saber nada da vida pessoal dos artistas dos quais gosto. Não os quero ver como pessoas, pois odeio pessoas. Quero apenas em mim a imagem da sua arte e do seu valor enquanto artistas. Quando os "conheço" enquanto seres humanos, jamais consigo olhar para a sua arte da mesma maneira. Eu sou estranho, eu sei!!!1
Para combater o ambiente pesado que criei, bastou ver dois gatos a apanhar sol na parte exterior da casa. Estavam tão fofinhos e tão contentes, apeteceu-me logo correr para eles e abraça-los enquanto lia Pessoa nas paredes....
Os gatinhos aparecem sempre em meu auxílio...

No cerco a Lisboa segue-se a Fundação José Saramago.
Dos sítios mais fantásticos onde entrei. Saramago vive naqueles 3 andares com alta vista para o Tejo. Tem ali uma biografia palpável do escritor.
Tudo, desde artigos que foram censurados na imprensa, a fotografias com muitos escritores portugueses. Desde os consagrados até à nova geração que Saramago ajudou a desabrochar como Gonçalo M. Tavares, João Tordo, Valter Hugo Mãe, etc.
Alguns políticos eram vistos nalgumas fotos, mas só políticos de esquerda. Porque será????? Se até há uma foto com Saramago e o seu suposto arqui-rival Lobo Antunes, porque não há um único político de direita numa foto a confraternizar com o escritor?
Mas, ver os rascunhos entregues à editora d`"O ano da morte de ricardo reis" e d´"O evangelho segundo jesus cristo" mesmo à minha frente dá mesmo vontade de roubá-los e sair dali a correr... É preciso muita contenção para não fazê-lo.
Imaginem o vosso livro favorito acabadinho de sair da máquina de escrever do escritor à vossa frente. Tentador, não????
Só encontrei um ponto negativo na fundação: a transmissão de um documentário sobre a casa de Saramago em lanzarote. É a minha tal aversão à vida privada. Não preciso de saber a cor dos edredons, nem de ver os naperons do homem e da sua esposa. Dispenso esses tipos de cusquices típicos de revistas cor-de-rosa.
Aconselho a visitar a fundação. O espaço está cedido pelo menos por mais seis anos, mas já sabem o que acontecerá se a direita subir ao poder em Lisboa...
3 euros não é nada demais. Os estrangeiros pagam 6. Ainda dizem que o homem não gostava de Portugal...

Para terminar o cerco, a visita ao museu Berardo. É aproveitar enquanto ainda é de borla!!!!
Estamos sempre a aprender. Fiquei a saber que encostar guitarras eléctricas a amplificadores e ligá-los é considerado arte minimalista. Portanto provocar enormes, estridentes, rebentadores de tímpanos feedbacks é considerado arte. Bem, se a tourada também é arte, isto realmente tem que ser uma arte bem superior.
Agora sempre que pegar numa guitarra eléctrica já ninguém vai fugir pois eu estarei a exprimir toda a minha dor e sofrimento através de ruído. Acho que tenho jeito para isso. Ainda vou ser grande um dia, vão ver. Toda a gente diz que eu não toco nada, mas ninguém faz feedbacks como eu. É que são mesmo sentidos. Vem da profundeza do ser. Em cada onda sonora aguda está uma parte de mim. Finalmente descobri a minha vocação!!!! Obrigado Berardo amigo!!!!!

2 comentários:

Sayuki disse...

tantas emoções num dia só. vais conseguir dormir ?! :) depois de ler todo este dia, só me apetece calçar as botas e fazer-me a toda essa história entre paredes!!

Blizard Beast disse...

Nem digas nada!!! Amanhã é a visita aos jardins da Gulbenkian na companhia de um livro de George Orwell para matar as saudades.