Sábado à noite e há concertos de Peste e Sida em Braga e Foge Bandido Foge em Famalicão, só que não estou com cabeça para fazer tantos quilómetros sozinho, portanto sucumbo ao convite endereçado por uns amigos que já não via há muito para uma noite de copos no idílico Porto.
O destino é o bar Altar na rua de Cedofeita. Já lá havia estado algumas vezes mas só desta vez reparei na decoração. Pinturas religiosas completamente alteradas que chocariam o mais devoto dos cristãos. Há de tudo; uma imagem da virgem Maria a mostrar uns seios voluptuosos. Um quadro da ultima tainada de cristo e seus apóstolos cujos rostos foram substituídos por grandes nomes do rock n roll, o tecto pintado de um azul celestial com uns anjinhos fofinhos a fazerem coisas marotas, enfim, blasfémia atrás de blasfémia como eu gosto.
A cerveja é a 1 euro e 10, verdadeiro achado já que os preços do Porto estão a ficar muito próximos dos de Lisboa com a diferença de que aqui ganha-se bem menos.
O som que rola é metal antigo com dois djs alternando entre si o domínio da mesa de mistura e o bar está com pouca gente. Pareço um arco-íris no meio das nuvens negras, pois estranhamente ando com vestimentas muito coloridas. Isso aliado ao meu cabelo à fózeiro ( expressão deliciosa nortenha para quem não conhece que é sinónimo do mundialmente famoso azeiteiro) causa curiosidade nas pessoas que trajam os fatos de guerra dos verdadeiros metaleiros.
A música, conversa e a cerveja (muita mesmo) destilam a alta velocidade e quando dou por mim está instalada uma grande festa no bar. Fico bastante surpreso pois já há muitos anos que não via tanta festa num evento relacionado com o metal. Geralmente os funerais são mais divertidos do que os concertos e noites de metal em bares.
A festa vai de vento em popa e um dos djs entrega-me o comando da mesa de mistura e aí estou eu a debitar overdoses de Metallica, Slayer, Megadeth, Sodom e Kreator para os metaleiros sequiosos que parecem ter orgasmos intensos ao mínimo acorde de uma qualquer música destes senhores.
E assim de repente são quatro da manhã e querem fechar o bar. Tarefa difícil quando a multidão está extasiada e embriagada. Isto merece uma medida extrema; das colunas começa a brotar "Keeping the faith" de bon Jovi. Boa táctica, aparentemente, para expulsar metaleiros, mas não estavam à espera do que aconteceu. Foi a loucura total. Fiquei estupefacto ao ver metaleiros e metaleiras de barba rija a dançar em cima das colunas ao som daquela coisa que alguém chama de música! Completa demência! Mas o melhor ainda estava para vir; de seguida jorra "The final countdown" dos Europe. Quase vinha abaixo o tasco! Completamente possuído, um metaleiro começa a fazer strip-tease em cima das colunas e eu assisto a tudo incrédulo. No final da música está na hora da debandada e eu já estou com uma borracheira daquelas!
Então sou trucidado por aquelas revelações filosóficas que só me acontecem quando estou com os copos. Eu tinha-me divorciado do metal, mas tinha saudades. Esta noite e o concerto de Paradise Lost acabaram por nos aproximar, é comparável àqueles casais que se separam e quando se reencontram vão dar uma rapidinha para recordar os velhos tempos. Portanto eu falei com o metal e vou ter com ele uma relação desse género. Vou andar por aí a curtir outros estilos de música, mas quando sentir saudades lá vou eu dar uma rapidinha. Uma relação totalmente aberta a partir de agora. Não lhe juro a fidelidade eterna que outrora havia feito, agora é mesmo poligamia...
Na rua embirro que tenho que entrar num bar que está já a fechar. O segurança atina comigo e estabelecemos ali uma conversa interessante até ao ponto em que ele diz que pertence à claque do Porto, Super Dragões. Eu respondo calmamente- :"Tasse bem, eu sou dos No Name Boys( Claque principal do Benfica)" As pessoas que estão comigo mudam de cor por temer pela minha segurança física, mas o que me acontece é ser abraçado pelo gajo ao mesmo tempo que me diz que eu tenho uns grandes tomates em dizer tal coisa no centro do Porto. Se ele soubesse que eu já andei a correr pela Avenida dos Aliados a gritar "Benfica, Benfica, Benfica"... eu sou masoquista, eu sei...
Em frente ao Plano B umas estudantes universitárias metem-se comigo e eu que tenho sempre as coisas mais originais para dizer, digo apenas isto:" Cuidado como falam com o Ser Supremo, o único exemplar da raça superior, o super-homem de Nietzsche." É assim, eu primo por surpreender toda a gente...
Interessante, uma das miúdas, é estudante de filosofia o que deu azo a muitos disparates filosóficos numa pseudo discussão embriagada e inflamada por raciocínios incoerentes. Vá lá que desta vez o meu interlocutor não adormeceu a meio de um alto discurso filosófico. As pessoas que estavam comigo perderam-se de mim aquando deste incidente e depois vêm com ar furioso procurar-me àquele local e é quando eu consigo assustar as míudas ao exclamar que vêm metaleiros raptarem-me para me transformarem no escravo sexual deles. Que pânico! Não me sabia assim tão credível! Foi preciso após parar o ataque fulminante de riso, muita explicação para os meus amigos não levarem na boca. Lindo...
A reter tudo desta noite, mas principalmente que a minha memória voltou a estar em grande forma...
Até à próxima borracheira...
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