segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Mais uma pérola da literatura portuguesa.

Poderá parecer paradoxal pois trata-se de uma peça jornalística sobre um jogo de futebol, mas digo-vos que se o jornalismo desportivo luso fosse assim sempre eu compraria um jornal desportivo todos os dias.
Isto é tão lindo que até é um desperdício ser sobre futebol.

"A militância sôfrega do Benfica, obstinadamente apontada a uma ideologia de consecução, tem tanto de comovente como de perigosa. Para os adversários, naturalmente, e para si mesmo. 

É uma guerra entre dois mundos, o anjo num ombro e o diabo no outro, um dislate digno do mais arrojado dos galanteadores: enamora, cativa, mas anda sempre no limiar do perigo, da inconsciência absurda dos que encontram na vida dupla os mistérios do prazer. 

Ora, o triunfo em Vila do Conde tem muito disto. Da virtude óbvia na manipulação ofensiva - ameaçadora, apoiada na movimentação louca de Lima e no pé esquerdo imemorial de Cardozo ¿ e da fragilidade sectarista no outro lado do jogo: a solidez, a consistência, a incapacidade de acalmar a onda de desejo. 

O golo de Lima, mesmo em cima do intervalo, evitou as consequências trágicas de quem bate só por bater, ama só por amar ou ataca só por atacar. Por desvario, por impulso, por devoção. Neste particular, não restem dúvidas, o Benfica é uma equipa encantadora, uma máquina compressora. (...)

 A visão dogmática do Benfica é clara, evidente: é uma estrutura de ataque, bate, mói, incomoda.

É só imaginar o mais enraivecido dos pugilistas para projetar a devida imagem. Enquanto os músculos dos braços respiram avidez, a esquerda (Cardozo) mostra uma potência surreal e a direita (Lima) soma KO¿s caprichosos e decisores. (...)

O pior, lá está, é a face negra desta forma de jogar e pensar. O Benfica altivo, diletante, é incapaz de identificar o momento certo para parar. O momento para gerir, lateralizar, quebrar o ritmo e a réstia de ânimo no oponente. (...)

A vitória do Benfica é um passo interessante neste campeonato, mas a tal militância cega pode trazer dissabores. Nenhuma teoria radical é capaz de ser razoável e equilibrada. É precisamente disso que a equipa de Jesus precisa urgentemente: sensatez em todos os momentos. "


Por Pedro Jorge Da Cunha in maisfutebol.iol.pt

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