quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Odisseias num tribunal...


Desloquei-me a um tribunal português para acompanhar o julgamento de um grande amigo meu.

Sim, porque eu só conheço criminosos da pior espécie. Criminosos cujo unicos crimes é o de se quererem divertir e desobedecerem às regras da decência impostas por uma sociedade demasiado depressiva para compreender como alguém ainda poderá ter motivos para festejar.

Esta conversa toda para dizer que o meu amigo estava a ser julgado por conduzir com excesso de alcool no sangue. É mais um para juntar ao gigante numero de pessoas que conheço que passaram pelo mesmo. Claro que eu também estou nele incluido.

A justiça devendo ser o expoente máximo da organização deste país, acaba por cair no rídiculo completo porque é a mais pura forma de anarquia. Mentiras voam a torto e a direito por todos os corredores. As paredes amarelecidas pelo passar dos anos, cheiram a isso mesmo: mentiras.

Passeiam-se pelos corredores os exemplos máximos da impunidade e da criminalidade de braço dado. Eu sentado num banco aguardando o desfecho de um julgamento físico; o do meu amigo e de um julgamento mental; o meu.

Estava embrenhado nestas minhas deliberações acusatórias e defensivas ao mesmo tempo, quando um magistrado se dirige a mim e pergunta a que horas é o meu julgamento. Como se estivesse à vista de todos que os meus pensamentos são criminosos. Vagueiam sempre pelo caminho da imoralidade e da indecência. Eu ao responder que não estava ali para ser julgado, fui olhado com uma enorme expressão de desdém. Ele sabe perfeitamente que sou criminoso nos meus pensamentos e emoções, mas que não existe por enquanto tribunal com capacidade administrativa para os condenar ou absolver.

O julgamento decorre todos os dias na minha mente. Os pensamentos e emoções defendem-se e acusam-se mutuamente. Num momento são arguidos e no outro são advogados de acusação, testemunhas, advogados de defesa ou mesmo juizes. Não precisaram de estudar por anos a fio para conhecerem as leis. Esse conhecimento foi adquirido com o desenrolar dos acontecimentos perpétuados na vida que levo.

A sessão de hoje está baseada no seguinte: o Amor foi constituido arguido pela prática de actos irreflectidos e prejudiciais para a sua e demais integridades fisicas e mentais. Será defendido pelo advogado Impulsividade bom conhecedor da causa. Representando a acusação está o excelêntissimo senhor doutor Racionalismo que é conhecido por toda a sua frieza e reacções implacáveis. A presidir esta sessão temos o senhor doutor juiz Sensibilidade, histórico julgador e julgado que deixa transparecer uma humanidade que pensar-se-ia inexistente em pensamentos ou emoções.

A sessão decorre sem grandes peripécias com ambos os lados a defenderam a sua causa. A acusação a defender uma pena de prisão para o Amor por este ser irracional quando deveria seguir as regras de contenção e de estar aliado às forças da sanidade quando na realidade está sempre aliado à loucura.

A defesa alega que o seu arguido sempre foi conhecido por não seguir regras pré-concebidas e que nessas mesmas acções irreflectidas é que se encontra a sua essência. Se racionalizasse todas as suas acções não poderia ser considerado Amor.

Isto decorre com a Tristeza e a Alegria presentes nas bancadas do tribunal como espectadores sem partido tomado porque ambas as partes tem o seu quê de razão.

Demoram o dia todo estas alegações com o juiz Sensibilidade observando e tomando notas de tudo o que considera relevante nos casos apresentados.

Várias horas passaram e chegou a hora da decisão do nosso conceituado juiz.

Todos se levantam para conhecer a decisão de caso tão complexo.

A decisão é favorável á defesa e ao arguido Amor. O juiz considera que todas as acções irreflectidas cometidas pelo arguido fazem parte do que é realmente a paixão. Não sendo permitidas todas e quaiquer acções impulsivas seria uma desvirtualização do que será sempre amar. Perante esta decisão o Amor é libertado e poderá continuar a cometer loucuras.

A acusação contesta esta decisão e promete estar sempre atenta a todas as acções do acusado convicta que o seu lugar é o encarceramento na prisão dos pensamentos e emoções. Chega assim ao fim esta sessão.

Para amanhã está marcada a sessão em que a Tristeza é acusada de ocupar sem licença a habitação da felicidade. Será defendida pelo Sofrimento e acusada pelo Sorriso. Este julgamento será presidido pelo juiz Amor. Este que hoje foi absolvido amanhã será o juiz.


1 comentário:

Mephisto disse...

O teu julgamento irá começar, mas podes crer que aqui serás sempre culpado mesmo declarado inocente.